Estou a pensar, Senhor, em tua desolação no Calvário.
Como pode um Deus sentir-se tão desolado? E como podem os homens desamparar o seuDeus?
Tiveste sede e apelaste para a sensibilidade humana. Como apelaste para Judas, na ânsia divina de o salvar.
Já havias dito, ns lições de teu Reino, que um copo d’água, dado de boa vontade, não ficaria sem recompensa.
Mas não havia, na miserável cidade dos homens, mãos generosas que te pudessem ofertá-lo.
E te contentaste com uma esponja embebida em vinagre.
Na liberalidade de um Deus, jamais, porém, tinhas hesitado em oferecer aos homens um mundo de fontes, de rios e de lagos!
Sabes, Senhor, os corvos certamente seriam mais sensíveis ao teu apelo.
Mas, é verdade, não vieste para salvar os corvos!
À beira daquele poço, longe dos teus, já tinhas tido sede. E a samaritana, desprezada pelo teu povo, foi mais generosa.
Ainda tens sede, Senhor, ainda tens sede. Não de hidrogênio-e-oxigênio, mas de corações verdadeiros.
Não de vivas ou de louvores, mas de almas simples, capazes de um “sim” puro e sem restrições.
Não da mistura híbrida de céu e de lama, de amor e de veneno, de aclamações e de ultrajes.
Não de bajuladores ou de torcedores, mas de corações livres, que aceitem o teu jogo, sem se preocuparem com o resultado final.
Tens sede de amor verdadeiro, e não de cânticos, de flores ou de poemas.
Mais do que a sede do Gólgota, hoje tens sede de corações puros.
Sim, porque, como verdadeiro Adorador, queres levar ao Pai corações que o adorem, em espírito e verdade.
Pois teu Coração, Senhor, é todo santidade, que não pode conter-se e, na misericórdia de um Deus, outra coisa não queres senão partilhar conosco a tua santidade!
João de Araújo