Encontro de Jesus com sua Mãe

O encontro de Jesus com sua mãe, na estrada do Calvário, não está explícito na Bíblia, mas a piedade popular consagrou esse encontro como real, numa sensibilidade que julgamos muito proveitosa para a vida cristã, uma vez que a existência humana está cheia desses acontecimentos, quer em sentido literal, aproximativo ou simbólico.

Senhor, na estrada da cruz, na via dolorosa do Calvário, contemplamos uma cena dramática, que só o amor mais puro poderá explicar plenamente: tu te encontras com tua Mãe, e tu, Maria, na mesma via da redenção, tu te encontras com teu Filho. É encontro de instantes, sabemos, de curto momento, diríamos, porque a soldadesca tem pressa para cumprir a ordem imperial. São dois olhares, pois, que se encontram: o teu, Jesus, um olhar de Filho-Deus, em sua expressão humana, já desfigurada pelo sofrimento, e o teu, Maria, um olhar de Mãe-exemplo, com sua feição divina e de celeste ternura. São olhares que se contemplam, olhares que se consolam, olhares que se comunicam na linguagem mais pura do amor e que são paradigmas para todos os olhares.

Aproxima-te, pois, Senhor, aproxima-te mais um pouco de tua Mãe, e tu, Maria, Mãe mais que dolorosa, aproxima-te também mais um pouco de teu Filho, pois queremos contemplar com mais ardor os teus olhares. De tais olhares o mundo está carente. Queremos que eles deem mais luz aos nossos próprios olhares. Sim, queremos olhar os irmãos com os olhos vivos da fé. Queremos vê-los com os olhos de Deus, para que neles descubramos a feição, o rosto, a expressão mais plena da dignidade humana. Queremos ver em teu rosto, Senhor, os rostos também desfigurados de tantos irmãos e, mais que vê-los, queremos dar-lhes a certeza de nossa afeição e de nossa comunhão fraterna.

Tu trazes, Senhor, a cruz em teus ombros. Ela pesa, sim, e pesa sobretudo porque nela carregas os nossos pecados, nossas malícias e nossas iniquidades (cf. Is 53,4-5). Mas, por isso mesmo, tu deves carregá-la. Se não o fizesses, de nossas manchas mortais quem nos libertaria? Estaríamos eternamente perdidos, é certo, e a morte continuaria a reinar sobre nós e a nos destruir. Então, Senhor, toma ânimo, o Calvário te espera, a tua hora chegou, e esta cruz que carregas vai brevemente transformar-se em árvore da vida.

E tu, Mãe da misericórdia, sabes melhor do que nós as razões do sofrimento de teu Filho. Sabes que esse desfecho mortal tornou-se inevitável e, de inevitável, Deus o fez útil e necessário à nossa salvação. Então, por mais que isso signifique para ti a dor mais profunda, nós te pedimos: não impeças teu Filho de chegar ao Calvário, não clames por justiça na estrada do Gólgota, porque o Príncipe deste mundo já foi julgado (cf. Jo 16,11).

Como Mãe silenciosa, então, Maria, confirma o desejo que ele traz no coração: o de morrer pelos pecadores, o de sacrificar-se pelos inimigos. Teu “sim” não foi apenas à maternidade divina, mas também a esse momento de total sofrimento humano. Se em Nazaré teu “sim” foi gozoso, aqui em Jerusalém será, como se vê, plenamente doloroso. São aspectos do mesmo mistério, pois, na sabedoria de Deus, a tristeza converter-se-á em alegria (cf. Jo 16,20), o luto e a morte em certeza de ressurreição (cf. Jo 11,40), o lenho da maldição (cf. Dt 21,23) em cruz gloriosa (cf. Gl 6,14); as chagas do desamor humano em chagas de bendita vitória (cf. Jo 20,24-27); e a Sexta-Feira da Paixão em Domingo de Páscoa.

Na estrada do Calvário vemos então, Senhor, essa manifestação de paz, esse encontro tão necessário. Encontro também de lágrimas, não importa. Encontro de olhares lacrimosos e condoídos, que se contemplam. Mais, porém, que de dor, sabemos, é encontro de consolo e de ternura. Momento de profunda partilha. Instante de pura redenção.

Agora, bendito Servo Padecente, e agora, humilde serva do Senhor, ajudai-nos a olhar a nossa realidade, a nossa triste realidade. No âmbito de nossas famílias, quantas mães necessitadas de encontro como este. Quantos filhos, talvez, à espera também desse momento! Mães, cujos filhos são de rua. Estão na rua. Distantes. No trabalho árduo e escravo. Muitas vezes nos porões da marginalidade e das drogas. Mães também, cujos filhos não lhes dão esta chance de amor. E filhos, cujas mães renunciaram, covardemente, à nobreza da maternidade, e cujos pais não assumiram, no amor, a grandeza de ser pais. Aqui, sim, a verdadeira tragédia, pela qual devemos chorar sempre mais.

Que esse encontro, Senhor, finalmente nos ensine a encontrar-nos no coração de Deus, fazendo florescer em nós o desejo sincero de converter tantas vidas desregradas, aprendendo também com tua Mãe, na espiritualidade viva do amor do Pai, a oferecer nossas vidas como testemunho ardente do verdadeiro amor. Amém. 

João de Araújo

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